O Benefício do Capitalismo Verde em Serrambi
Os corais, conhecidos como as "florestas tropicais dos oceanos", desempenham um papel essencial na manutenção da vida marinha.


Paula Cavalcante
10 de setembro de 2025
O mar sempre fez parte da minha vida. Passei muitos verões completamente imersa no fascinante mundo aquático de Serrambi, uma praia brasileira no litoral sul de Pernambuco, que guarda em suas águas um ecossistema único. Lembro-me de que, nessa atração pela vida marinha, sobretudo pelos corais, a cada verão precisava ir mais longe para rever as espécies de que mais gostava. De um ano para outro era notório que diminuíam drasticamente.
Mais tarde, avançando em meu caminho acadêmico, tristemente, soube que "os recifes de corais estão rapidamente caminhando para uma degradação irreversível, e sem esforços globais para abordar os principais fatores de mudança, como o aquecimento global e a pesca excessiva, muitas espécies de corais podem enfrentar a extinção até o final deste século" (Bellwood, 2004). Descobri também que essa notícia, que para mim era chocante e inaceitável, era amplamente conhecida na comunidade científica, política e midiática. Ainda assim, ano após ano testemunhei o desaparecimento dos corais. Ela foi arquivada na pasta de efeitos colaterais da poluição e do aquecimento global e esquecida pelos responsáveis políticos e comunitários de Serrambi.
Os corais, conhecidos como as "florestas tropicais dos oceanos", desempenham um papel essencial na manutenção da vida marinha. De acordo com o periódico Trends in Ecology and Evolution (TREE), "os recifes de corais abrigam cerca de 25% de todas as espécies marinhas conhecidas, embora cubram apenas 0,1% do fundo do oceano" (Roberts & Hawkins, 1999). Por sua importância, já estão na lista dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) criada em 2015 pela ONU. O objetivo 14, “Vida na água”, visa "conservar e usar de forma sustentável os oceanos, mares e recursos marinhos para o desenvolvimento sustentável".
Diante da relevância do tema, este ensaio busca discutir as causas e consequências da extinção dos corais, com destaque para a influência das mudanças climáticas e da acidificação dos oceanos, bem como explorar as estratégias de conservação portuguesas e internacionais. Além disso, cabe comentar sobre a repercussão midiática na Europa sobre o tema.
Os corais são extremamente sensíveis e não estão resistindo ao aumento das temperaturas dos mares nem à acidificação causada pela poluição, especialmente pelas emissões de CO₂. Esse estresse ambiental tem levado ao fenômeno de branqueamento e, consequentemente, à morte dos recifes. Sabe-se que essa devastação não afeta apenas a biodiversidade marinha, mas também a humanidade, pois muitas comunidades dependem dos recifes para atividades econômicas, subsistência e turismo, o que ameaça a segurança alimentar de milhões de pessoas.
Em Portugal, a estratégia de conservação dos recifes de corais segue as diretrizes das legislações ambientais europeias, os ODS e os Acordos de Paris. A Rede Natura 2000, um dos principais instrumentos de conservação da natureza na União Europeia, visa proteger a biodiversidade das espécies de corais no Arquipélago da Madeira e no Algarve. O país também estabeleceu áreas marinhas protegidas e regulou atividades pesqueiras e turísticas. Além disso, adota um serviço de monitoramento constante da saúde dos recifes.
Iniciativas como o LIFE IP - Natura 2000 no Mar, a Coral Triangle Initiative e a ReefBase, que surgiram fora de Portugal, têm buscado reflorestar os recifes na Europa. Embora essas ações sejam originadas por organizações internacionais, são essenciais para a sobrevivência dos corais, pois, sem medidas protetivas específicas e intencionais, os recifes desaparecerão.
Na Europa, a mídia tem desempenhado um papel fundamental ao alertar incessantemente sobre os impactos das mudanças climáticas e a urgência de cumprir os compromissos internacionais. Emissoras de televisão denunciam abusos ambientais, produzem documentários de sensibilização e investigam a saúde da biodiversidade marinha em países em desenvolvimento, como Egito, Indonésia, México e Brasil. No entanto, apesar da crescente conscientização global, os recifes da minha praia continuam a se deteriorar, revelando a discrepância entre a mobilização midiática e as mudanças concretas nas áreas mais vulneráveis.
Sabemos que a segurança da biodiversidade marinha só pode ser alcançada por meio da cooperação global, com a ampliação dessas iniciativas. A Europa, nesse contexto, desempenha um papel crucial como agente transformador. Contudo, apesar da importância dos arrecifes, as florestas marinhas não recebem a devida atenção governamental.
Em contraste, o Fundo Amazônia destina milhões de reais a ONG ambientais brasileiras para a preservação da Amazônia Legal. Essa atenção especial à floresta terrestre é compreensível quando se considera que o Código Florestal Brasileiro (Lei nº 12.651/2012), a Lei de Áreas Protegidas (Lei nº 9.985/2000) e a Lei de Gestão de Florestas (Lei nº 11.284/2006) autorizaram a exploração internacional da reserva amazônica, gerando lucro para países ricos.
Parece que há um incentivo financeiro para proteger recursos naturais que oferecem lucro imediato. No caso da Amazônia, entre muitas outras riquezas extraídas pela Europa, podemos citar madeiras nobres, como a ipê, cedro e mogno; minérios, como ouro, bauxita e manganês,;petróleo, gás natural e produtos como borracha, resinas e óleos essenciais, que são exportados para usos industriais e cosméticos.
Já no caso da floresta marinha esse investimento não ocorre, pois os corais não geram retorno financeiro direto para a União Europeia. Como James O'Connor, sociólogo e ecologista marxista, afirma em sua obra Natural Causes: Essays in Ecological Marxism (1998), as políticas ambientais dos países ricos, com o apoio da mídia, muitas vezes tratam das questões ambientais nos países em desenvolvimento não por altruísmo, mas com o objetivo de acumular capital e garantir o acesso a recursos naturais.
Assim, reconhecendo que a mídia desempenha um papel fundamental no incentivo ao pensamento crítico e, idealmente, oferece aos ouvintes, leitores e telespectadores as ferramentas necessárias para questionar e analisar o mundo ao seu redor, é essencial que os meios de comunicação europeus ampliem e incluam discussões sobre o "capitalismo verde" (termo apontado por O'Connor). Dessa forma, por meio de constantes denúncias e uma conscientização crescente, o meio ambiente poderia se tornar uma prioridade maior do que o capital, e, com isso, haveria a esperança de que os recifes de corais fossem efetivamente salvaguardados.
Diante dessa realidade, é possível concluir que, embora os arrecifes recebam atenção na Europa, eles ainda não recebem a devida urgência governamental quando comparados com as florestas terrestres, principalmente devido à falta de rentabilidade associada à sua preservação. Além disso, a mídia raramente aborda essa disparidade. Caso não haja uma mudança rápida nesse paradigma, temo que, ao retornar ao Brasil, não encontre mais vivos os corais de Serrambi.



