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Empatia e resiliência: o poder das narrativas

Sonhos de igualdade, por parte de quem emigrou, de quem viu família/ amigos partir, de quem regressou, de quem tem o coração tão grande quanto uma volta ao mundo(1).

Empatia e resiliência: o poder das narrativas
Carlos Barros
29 de março de 2023

A vida é sempre uma experiência na qual nenhum de nós (na verdade) sabe o que está a fazer. Tentamos ir pelo caminho que nos faz mais sentido: seja pelo que nos é transmitido por familiares, amigos e colegas, por livros, séries e filmes que corremos de fio a pavio, pela educação formal (escola) ou informal (“escola da vida”), onde vemos que há mais mundo além de nós.

A maior recompensa é ver, com genuíno desprender de barreiras, as histórias, motivações, expetativas e medos que cada um sente, com vista à redução de desigualdades. Neste caminho vamo-nos encontrando e, como se estivéssemos em frente a um espelho, há vários momentos em que dizemos “sim, de facto, chegou o momento de mudar a minha vida. Quiçá, ter uma nova”.

Muitas dessas pessoas, talvez por verem o “reflexo” no espelho sem pudores à mudança, são migrantes. Cidadãos e cidadãs do mundo que desafiam as normas culturais, que se adaptam entre línguas, costumes, gastronomia, hábitos de trabalho, convivência e de gestão de expectativas.

Além de ter tido o privilégio de conviver na minha vida pessoal com a interculturalidade desde sempre, tive ainda a incrível oportunidade de aprofundar estes temas na minha vida profissional. De tudo, recordo sempre que há um algo altamente importante para a redução de estereótipos em todas as idades, línguas e todas as características pessoais e sociais que se possam imaginar. É tão simples como ver o Outro com empatia.

Um dos projetos que mais gosto me deu de idealizar, estudar e desenhar foi o Sem Fronteiras(2). Com a premissa inicial de entrevistar em formato de jornalismo de cidadania emigrantes de férias em Portugal no verão de 2019 [1], pude viajar em mais realidades, vivências e desejos para o futuro nas vidas de mais de uma dezena de pessoas.

Em 2020, ano de caos, mas também de reflexão, tive a boa nova de saber que este projeto ia poder dar a conhecer as histórias, rugas de riso-choro de migrantes (e também as minhas) em formato de documentário e série de episódios. Tudo em dois eixos que vivi como verdadeiro elixir da aprendizagem.

Num eixo – o documentário, em que acompanhei a viagem de um emigrante a Portugal – pude ver, sentir e participar da solidariedade e ambivalência que é ser-se de duas realidades ligadas por uma difícil logística de visitas. Sem querer fazer spoiler deste fantástico produto de consciência, pude não só viver a experiência de acompanhar uma longa viagem, mas também a exigência física/emocional que acarreta: vir de Paris de carro até Portugal é duro. Parece fácil, mas não é, de todo.

Excetuando a logística de realização feita por profissionais (Philippe Machado, Arsène Desmichelle e Guillaume Ladiray) há o aguentar de ver uma família com coração apertado a desejar boa viagem, do tempo no carro, da chuva/ neve, de querer parar quando não é possível (mas o consolo do sol na estrada), a incerteza de quando/ como voltamos a ver as pessoas. Sobretudo, da ansiedade de querer-se chegar ao destino (casa em Portugal), quando há ainda quilómetros e etapas a passar que parecem infindáveis.

Recordo-me, como se fosse hoje, do corajoso-entrevistado (em contínuo), ter cantado “Estou além” do António Variações, de vermos a placa a confirmar a chegada a Portugal e do choro embargado. Da gratidão de ter podido viver a experiência toda e agora podermos dar ao mundo mais um exemplo audiovisual de uma vida que representa muitas.

No outro eixo – entrevistas individuais – pude reinventar-me como Ser Humano e profissional. Ora, se por um lado o contexto atual exigiu mais cuidados, a reinvenção de entrevistas entre o pessoal-digital, também permitiu que pensássemos com mais profundidade nas nossas vidas.

Com um guião que desenhei em torno de convidar os participantes a viajar ao passado, ao que sentem no presente e como se vêm no futuro, descobri sonhos que as câmaras têm guardadas como exercícios de cidadania.

Sonhos de igualdade, por parte de quem emigrou, de quem viu família/ amigos partir, de quem regressou, de quem tem o coração tão grande quanto uma volta ao mundo.

Encontrei (muitos) potenciais escritores, pintores, artistas, assistentes sociais, politólogos, educadores, sexólogos, professores, sociólogos, economistas, cineastas e, sobretudo, braços abertos a acolher a novidade, luta e ética para crescerem para uma comunidade internacional mais unida.

Agora, depois de ter tido o privilégio de me surpreender em cada momento, de lágrimas de emoção e de rir (também até às lágrimas), resta-me apelar a que possamos manter-nos saudáveis, seguros e em breve ver de mãos dadas com quem gostamos o incrível trabalho dos muitos profissionais que editam os retratos e vozes em vários países.

Um obrigado gigante pelo crescimento Humano.

Mesa Redonda
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