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Uma perspetiva de renovação: O corpo através da obra de Helena Almeida e Claude Rutault

Hoje resgato a obra de arte contemporânea dos artistas plásticos Helena Almeida (1934–2018) e Claude Rutault (1941–2022) para explorar as relações entre o corpo e o espaço.

Uma perspetiva de renovação: O corpo através da obra de Helena Almeida e Claude Rutault

Francisca Gigante

12 de abril de 2023

A celebração da Páscoa é uma oportunidade para refletir sobre as temáticas de esperança e superação na nossa vida e na cultura, mas também de renovação no nosso corpo.

Hoje resgato a obra de arte contemporânea dos artistas plásticos Helena Almeida (1934–2018) e Claude Rutault (1941–2022) para explorar as relações entre o corpo e o espaço. Ambos artistas conceptuais que desafiaram as ideias tradicionais de arte contemporânea relativamente à pintura. Enquanto Helena Almeida incorpora fotografia, desenho e escultura no seu trabalho, Claude Rutault enfatiza o processo de criação da pintura em vez da criação terminada.

O seu trabalho expande-se da bi-dimensionalidade ao relevo com altura, profundidade e largura: a três dimensões, sem se tornar escultura. Vem-nos à memória o corpo que pode ser arte, ser humano e alma a três dimensões.

Interessa-me sobretudo falar aqui sobre o envolvimento do corpo como tema central, tema essencial para o seu trabalho. Na obra de Helena Almeida encontramos frequentemente o seu próprio corpo nas suas fotografias e pinturas, por alguma razão são como que performances em suspenso. Em Claude Rutault as pinturas são criadas em resposta ao espaço físico onde são expostas. Rutault escreve e define uma série de regras e instruções para que se possa definir o método de criação ou atualização da obra. A primeira de-finition/methods foi criada em 1973 e revela as formas exatas, o formato específico a ser criado. É uma maneira de colocar o corpo da obra em aberto, em contínuo, porém participativo e contratual com quem o lê, vê, sente. Mas também contingente com as condições estabelecidas, com os parâmetros das regras definidas e o próprio ambiente. O artista é árbitro do jogo que iniciou e toma as consequências do quadro final.

A resposta do corpo ao espaço é aqui, de facto, muito íntima e extremamente familiar. Os artistas assumem a obra de arte como o seu próprio corpo. A sua arte, ou o seu corpo na arte, partilha desta íntima interação com o ambiente. As obras tornam-se corpos no espaço que habitam. O corpo explora ao limite as possibilidades de espaço e forma. Meditemos agora na relação entre o corpo e a alma, e chegaremos à ideia de que a morte pode ser vista como uma passagem para um novo estado de existência. Através do corpo, além do corpo.

O processo no trabalho dos artistas vai também além da própria criação finalizada. Helena Almeida cria séries de ações performativas para tomar a forma de fotografias e pinturas, e Rutault cria um conjunto de regras a priori que devem ser seguidas na sua pintura. Ocorre, portanto, uma transformação peculiar, ou seja, a pintura, que se inicia como conceito, passa agora a operar dentro do corpo do artista, torna-se objeto. A forma como o corpo de Helena Almeida aparece em Estudo Para Um Enriquecimento Interior (1977-78) nas seis fotografias a engolir a tinta azul que pincelou após a captura da imagem com a boca a abrir é uma imagem bem viva deste acontecimento.

Note-se que o corpo se revela minimalista. Formas simples e geométricas – como se se tratasse de imagens poéticas, bem além da forma documental – surgem na tela de Helena Almeida. Similarmente, campos de cor ousados monocromáticos caracterizam a pintura de Claude Rutault.

Para estes artistas compreender o mundo é, portanto, ver na sua obra uma janela, uma moldura sem fronteiras físicas, que se distancia e se encontra de novo nesse mesmo corpo, que é obra de arte.
Com efeito, a obra dos dois artistas convida-nos a refletir sobre a interação entre o nosso próprio corpo, a nossa alma e o ambiente em que vivemos. Abre-nos a porta para considerar a morte como passagem através da contemplação e do entendimento do mundo através da arte.

À luz da celebração da Páscoa, o corpo ganha uma nova dimensão. Esta é uma nova oportunidade para nos libertarmos dos nossos próprios limites e refletirmos sobre a relação com o nosso próprio corpo e com os outros corpos, para procurar uma renovação interior e nos abrirmos à esperança e superação que a Páscoa representa.

Ver a nossa existência como uma obra de arte em constante evolução e em diálogo permanente com o ambiente e a nossa alma é crucial. Isto tudo em paz com as regras estabelecidas e com confiança para enfrentar os desafios que a vida nos apresenta. Uma Santa Páscoa a todos.

Mesa Redonda 
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