A narração evangélica de S. Marcos apresenta-nos uma intensa jornada de Jesus que, acompanhado dos seus primeiros discípulos cura a sogra de Simão e uma multidão de gente atormentada no corpo ou na alma. Uma jornada de libertação integral do Senhor, sustentada por uma demorada oração em lugar isolado e silencioso, apesar da multidão que O procura, não se deixando prender, para ir mais longe, a outros lugares e a outras pessoas igualmente necessitadas de cura e de vida plena.
V Domingo do Tempo Comum
Lemos e meditamos os textos sagrados deste Domingo com o coração e a mente perturbados pela avalanche de informações e imagens sobre o avanço da Covid 19, com as suas variantes. Sucedem-se os máximos de óbitos, doentes infetados, internados, em cuidados intensivos. Certa confusão e desnorte na vacinação em curso aumenta as dúvidas e a perplexidade. Os hospitais no limite, os profissionais de saúde exaustos, o país em confinamento geral, a incerteza e o sofrimento.
Em lamentável coincidência e contrassenso, assistimos à aprovação da lei da eutanásia e do suicídio assistido, permitindo a morte provocada no momento do maior agravamento da pandemia, quando todos queremos salvar o maior número de vidas, aceitando sacrifícios sem paralelo por este valor maior, como escrevem em comunicado os nossos bispos.
Depois de já terem rejeitado a iniciativa de um referendo nesta matéria, agora que importa unir a todos na luta pela preservação da vida humana, a maioria dos deputados, contrariando os pareceres das ordens profissionais do setor da saúde e do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, abrem a porta para uma cultura de morte… A fuga para soluções de facilitismo e absolutização da vontade própria, sem verdadeiro compromisso solidário e fraterno, na defesa e promoção da vida, corre o risco de nos afundar num retrocesso civilizacional.
Felizmente, também temos visto inúmeros gestos e iniciativas de solidariedade por parte de associações, voluntários e figuras públicas dando as mãos e apoiando de modo criativo o enorme combate a favor da saúde e da vida de todos, a começar pelos mais frágeis e desprotegidos. A proximidade do Dia Mundial dos Doentes (11/02/21) e a recente publicação das catequeses do Papa em tempo de pandemia, com o título “Curar o Mundo”, colocam-nos nos passos de Jesus, segundo as leituras e o Evangelho de hoje.
A experiência de sofrimento de Job, na primeira leitura e o seu clamor de homem crente e justo que tudo põe nas mãos de Deus indica a direção correta. Job era uma pessoa fiel a Deus e experimentou todo o tipo de desgraças. Contudo, manteve a fé e a confiança no Senhor. Não esconde as dificuldades da condição humana, mas ensina que se pode manter a fé no meio do sofrimento. Afirma que a única segurança e certeza está em Deus, diante do qual desabafa toda a sua dor. A oração de Job é feita de gritos e de lágrimas: “Recordai-vos”, Senhor! Quem grita e chora, mesmo que o não saiba, está a invocar a Deus e a sentir a sua presença consoladora.
O testemunho de Paulo, na 2ªleitura, de disponibilidade e compromisso total com a Boa Nova de Jesus que veio para que todos tenham vida e a tenham em abundância, merece ser levado a sério, fazendo também nós tudo para ser participantes dos bens do Evangelho. O seu serviço, de entrega incondicional, foi generoso e desinteressado, sem procurar recompensa nem proveito pessoal.
Ora, justamente, a narração evangélica de S. Marcos apresenta-nos uma intensa jornada de Jesus que, acompanhado dos seus primeiros discípulos cura a sogra de Simão e uma multidão de gente atormentada no corpo ou na alma. Uma jornada de libertação integral do Senhor, sustentada por uma demorada oração em lugar isolado e silencioso, apesar da multidão que O procura, não se deixando prender, para ir mais longe, a outros lugares e a outras pessoas igualmente necessitadas de cura e de vida plena.
A mensagem deste Domingo ilumina, pois, as situações: de angústia e inquietação, como no caso de Job; de confiança e compromisso com o Evangelho da vida que é urgente fazer chegar a todos, como exorta o apóstolo Paulo; de gente de fé que segue Jesus nas suas atividades e encontros salvadores e aprende a unir a sua proximidade às pessoas, à ação, à oração, anúncio e missão libertadora.
Fala-nos de sofrimento e angústia, mas também da proximidade e amor de Deus, que se fez um de nós em Cristo para ir ao encontro da fragilidade e impotência humana perante os diversos males e flagelos. Ele, o Senhor da Vida, que “suportou as nossas enfermidades e tomou sobre Si as nossas dores”.
Na multidão que se concentra à porta da “casa de Pedro” (figura da Igreja, ontem e hoje) podemos ver a humanidade que anseia pela libertação e que grita, dia a dia, a sua frustração pela miséria, pela exclusão, pela falta de amor. Será que os nossos irmãos idosos, doentes e esquecidos encontram nos nossos gestos o amor libertador de Jesus que dá esperança ou encontram egoísmo e indiferença?
Jesus, que cura aqueles de quem se aproxima, que não se deixa confinar, e parte dizendo-nos: “Vamos a outros lugares, às povoações vizinhas, a fim de pregar lá também, porque foi para isso que Eu vim”. Com Jesus, vão também os que escutam as periferias, os que descobrem a sede do irmão, os que não têm medo de tocar o outro, os que se misturam e são fermento. Com Jesus, vamos também nós a outros lugares e, na força da oração, semear a luz de uma vida sempre nova e ressuscitada e ser Evangelho!
Jesus que, procurado por todos, busca a intimidade com o Pai e, ao romper da jornada retira-se para um lugar ermo para rezar, para reencontrar a serenidade e as forças necessárias para viver e percorrer os caminhos dos homens fazendo o bem. Que a nossa vida seja assim: de muito empenho na missão, mas muito firmes e unidos ao Senhor.
Jesus é a presença consoladora do Deus que cura e salva, que manifesta o seu poder na luta contra o mal. É o enviado de Deus para levar a Boa Nova a todos os que sofrem, como no caso da sogra de Simão, de cama com febre, e de muitas pessoas atormentadas por várias doenças, a quem Ele estende a mão e põe de pé para, por sua vez, livres dos espíritos do mal, fazerem o bem.
Conforme o comunicado da Família Vicentina, de 31.01.21, perante a legalização da eutanásia, o seguimento de Jesus compromete-nos como seus discípulos a cuidar, por amor, das vidas dos nossos irmãos sofredores: apoiando os mais frágeis e atingidos por doenças, levando todos os dias conforto corporal e espiritual às suas casas, hospitais, lares, residências seniores, unidades de cuidados paliativos, pois todas as vidas importam.
Oração: concedei-nos, ó Deus de bondade e da vida, a graça de esvaziar-nos do espírito individualista, das forças que geram exclusão, sofrimento e morte.
Que o Vosso Espírito nos torne pessoas livres para o serviço da vida e
da cura de todo o mal que domina as nossas mentes e corações!
Senhora das Graças, “Saúde dos Enfermos”, com a vossa materna intercessão, sustentai e acompanhai a nossa fé e alcançai-nos de Jesus vosso Filho, a esperança no caminho da cura dos males que nos afligem. Amén!