A Eucaristia faz a Igreja. Antes de morrer, Jesus pede pela unidade: “Que todos sejam um, como Tu, ó Pai, estás em Mim e Eu em Ti; que também eles sejam um em nós, para que o mundo creia que Tu me enviaste” (Jo. 17, 21).
Solenidade do Corpo e Sangue de Cristo
Com a Solenidade do Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo celebramos o Sacrifício e Banquete da Santíssima Eucaristia, na Solenidade do Corpo e Sangue de Cristo, na Quinta-Feira, a seguir à da Santíssima Trindade. As leituras do Ano B pedem para meditar o mistério da Eucaristia, como expressão da Aliança, entre Deus e o Homem, entre Deus e o Povo. O Mistério centra-se na Pessoa de Jesus, verdadeiro, único e eterno sacerdote e Filho de Deus, que se fez homem, para se oferecer, por nós, no memorial do sacrifício da cruz, criando a unidade da Igreja e selando, com o dom do Seu preciosíssimo Corpo e Sangue a nossa definitiva aliança, com Deus.
Indo ao cerne do mistério, a Igreja canta: “ Ó sagrado banquete em que se recebe Cristo, se comemora a Sua Paixão, a alma se envolve de graça e nos é dado o penhor da futura glória”. A Eucaristia torna presente o Sacrifício da Cruz, na oferta e comunhão do Corpo e Sangue do Senhor, que Ele nos dá, em alimento, enchendo-nos da graça, na expectativa de obter e participar nos frutos da Ressurreição gloriosa. Assim a Eucaristia é o coração da Igreja e do Mistério Pascal de Cristo e o sacramento da aliança eterna de união, com Cristo, pelo Espírito, em Deus. A Eucaristia é o gosto antecipado da vida gloriosa e celeste, sendo a aurora da feliz e eterna surpresa, com Cristo, em Deus.
A Aliança de Deus, com o Povo de Israel, espelha a praxe cultural dos pactos e das alianças políticas dos soberanos com os vassalos, na antiguidade bíblica e pré-bíblica. O documento escrito era aceite pelas partes e selado, no sacrifício de comunhão, com a marca da aspersão do sangue do animal sacrificado. Moisés aspergiu o altar de Deus e com o resto do sangue aspergiu o Povo, que aceitou a vontade e os mandamentos de Deus. O sangue da vítima unia os contraentes, Deus e o Povo Eleito. Na Bíblia Grega a Aliança ou Pacto recebe ainda a conotação de Testamento, que só é executado após a morte dum dos contraentes. A Morte de Cristo e o Seu sangue são sinais da aliança nova, que garantem a herança eterna. De qualquer modo a ideia original de Aliança expressa a comunhão de vontades e propósitos, que no Antigo Testamento se resume deste modo: “ Vós sereis o meu povo, Eu serei o Vosso Deus”. Eu ser-vos-ei sempre fiel e Vós cumprireis aquilo que vos mando”.
A nova Aliança com Deus foi selada não com sangue de animal, mas com precioso sangue de Cristo, Filho de Deus, Supremo e Eterno Sacerdote, Pastor e Mediador entre Deus e o Homem, enquanto verdadeiro Deus e Homem. Jesus ofereceu-se, uma vez por todas, na Cruz, e a Eucaristia como Sacramento da Sua presença real, documenta e testemunha o amor do Filho de Deus, que nos amou até ao extremo de dar a vida e de morrer por nós. Deste modo, Jesus é o Sacerdote oferente e o Cordeiro ou a vítima oferecida em oblação a Deus. Ele é o altar e o templo. O Pai mandou o Filho ao mundo para ser um de nós e como nós, excepto no pecado. Jesus Ressuscitado que nos leva ao Pai e nos abre a porta do Céu, é a grande surpresa e novidade, é o Corpo glorioso, não feito por mãos humanas, mas a obra inefável de Deus.
Por três vezes, Marcos, ao narrar a Instituição da Eucaristia, fala da Páscoa e da Ceia Pascal, cenário e horizonte, em que Jesus se entrega para realizar a verdadeira, a única e eterna aliança, que nos dá a vida, nos liberta e aceita o serviço dado, por nós, a Deus, em liberdade. A Eucaristia está conexa com a Páscoa, com a Passagem libertadora, com a gesta salvífica do Êxodo e converte-se na síntese das maravilhas de Deus.
A Eucaristia faz a Igreja. Antes de morrer, Jesus pede pela unidade: “Que todos sejam um, como Tu, ó Pai, estás em Mim e Eu em Ti; que também eles sejam um em nós, para que o mundo creia que Tu me enviaste” (Jo. 17, 21). O Corpo e Sangue de Cristo, dado em alimento, é o sinal sacramental que significa e realiza a aliança definitiva com Deus, não selada, com sangue de animais, mas com o Precioso Sangue do Filho de Deus.
Ao instituir a Eucaristia, Jesus deixa de comer para dar de comer aos Doze o alimento novo que sela a aliança nova e eterna com Cristo, em Deus. Jesus interrompe a Ceia Pascal, para criar algo novo, descido do céu, obra de Deus e sinal obreiro da nova e eterna aliança com Deus, em Cristo, no Espírito. A Eucaristia é obra da Santíssima Trindade, é uma nova criação do dom celeste, que o Espírito, realiza na conversão e transformação ou transubstanciação do pão e do vinho que o Espírito faz. Na Epiclese ou oração da invocação do Espírito Santo, que precede o relato da Instituição da Eucaristia, pedimos a vinda do Espírito, para que o pão e o vinho apresentados, se transformem no Corpo e Sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo.
Na Solene Procissão, pelas ruas da Cidade ou Aldeia, que se faz, quando existe ambiente para tal, Jesus Sacramentado, reconhecendo que se não estabelecermos a frutuosa e íntima Aliança com Cristo e não nos deixarmos converter e transformar, por Ele, com Ele e n’Ele não o recebemos nem o comungamos. Há que discernir, confessar, adorar e reconhecer o verdadeiro pão do Céu, para não comermos nem bebermos a nossa condenação como adverte São Paulo. Só viveremos unidos em aliança com Deus se crescermos e vivermos na comunhão fraterna e eclesial, pois “ ninguém pode ter a Deus por Pai se não quiser ter a Igreja por mãe”, como diz S. Cipriano, mártir e bispo de Cartago. E São João, o grande paladino do amor e da Eucaristia, diz, na sua Primeira Carta: “ ninguém diga que ama a Deus a quem não vê se não ama o irmão que vê.”
Na verdade, a Eucaristia em Igreja só tem sentido quando o nosso amor é igual ao de Jesus: um amor sem medidas, um amor que não é egoísta nem interesseiro, um amor que se entrega. Desde sempre que os primeiros cristãos associaram a Eucaristia à vida. A comunhão não é só para a alma, não tem só efeitos espirituais. A comunhão de Jesus deve levar-nos à comunhão de vida, à comunhão de bens, à comunhão no serviço…
Nas palavras da instituição da Eucaristia Jesus começa por dizer: “ Tomai e comei”. Jesus entregou-nos o dom da sua vida porque Se entregou a nós. E nós? Que fazemos da nossa vida? Em que é que ela é verdadeiramente eucarística?
Que a celebração da Eucaristia, muitas vezes rotineira e, para alguns, até contra-vontade, desperte em nós este desejo de ter Jesus na nossa vida, mas, sobretudo, de sermos Jesus para a vida dos outros.