O Evangelho deste Domingo XIII do Tempo Comum oferece-nos dois milagres de Jesus, relatados de forma entrelaçada, isto é, um dentro do outro: o relato da cura de uma mulher que há doze anos sofria de uma hemorragia, dentro do relato da chamada «ressuscitação» da filha de um dos chefes da sinagoga.
Domingo XIII do Tempo Comum
O Evangelho deste Domingo XIII do Tempo Comum oferece-nos dois milagres de Jesus, relatados de forma entrelaçada, isto é, um dentro do outro: o relato da cura de uma mulher que há doze anos sofria de uma hemorragia, dentro do relato da chamada «ressuscitação» da filha de um dos chefes da sinagoga.
Depois da tempestade acalmada (Mc 4, 35-41), o barco em que os discípulos vão atravessando o lago, com Jesus na popa, deitado na almofada, chega à outra margem. E mais uma vez, há uma multidão imensa, proveniente de várias localidades, que continua à beira-mar, e que procura ver, tocar e escutar Jesus. No meio desta multidão anónima emerge um dos chefes da sinagoga, de nome Jairo, que rasga a multidão e vem “religiosamente” prostrar-se aos pés de Jesus e implorar-lhe que vá impor as mãos à sua filhinha que está a morrer. E Jesus foi com ele, sempre rodeado pela multidão.
Esta é uma primeira verificação importante: Jesus é aquele que vai sempre connosco. Nomeadamente com aqueles que mais sofrem. Nas ocasiões em que o sofrimento trespassa as nossas vidas, Ele acompanha-nos, partilha o nosso caminho e as nossas dores.
E lá vai Jesus, Jairo e a multidão, quando a nossa atenção é direcionada para os gestos e pensamentos de uma mulher anónima que sofria de uma hemorragia havia doze anos.
Esta doença colocava esta mulher numa situação física, social e religiosamente muito dolorosa, pois, aos olhos da conceção do tempo, tornava-a impura. Portanto, deveria ficar distante de Deus e das pessoas. Eis, senão quando, com toda a ousadia, fé e confiança, fura por entre a multidão e consegue chegar junto de Jesus e tocar-lhe por detrás, na fímbria do manto, dizendo consigo: «Se eu, ao menos, tocar nas suas vestes, ficarei curada». No mesmo instante estancou o fluxo de sangue e sentiu no seu corpo que estava curada da doença.
Obtido o que pretendia, a sua história poderia ter acabado aqui. Mas, nãos. É Jesus que não se limita à cura física e traz esta mulher para o centro da comunidade dos que o seguem.
Voltou-Se para a multidão e perguntou: «Quem tocou nas minhas vestes?». Os discípulos responderam-Lhe: «Vês a multidão que Te aperta e perguntas: ‘Quem Me tocou?’». Mas Jesus continuou a olhar em volta. A mulher, assustada e a tremer, por saber o que lhe tinha acontecido, veio prostrar-se diante de Jesus e disse-Lhe a verdade. Jesus respondeu-lhe: «Minha filha, a tua fé te salvou».
Uma segunda verificação importante: é preciso aproximar-nos de Jesus e dizer-lhe a verdade do que vai no nosso coração. Isso toca profundamente Jesus. E ainda que lhe toquemos ao de leve ou nas pontas da roupa não ficamos no anonimato, sem vínculo. Ele quer que passemos a fazer parte da Sua família, por isso, conclui afirmando a sua nova condição: «Minha filha».
Esta cena bíblica recorda-me sempre um diálogo que tive com uma doente, quando fui Capelão no Hospital de São João. Por ocasião do cinquentenário do hospital iniciaram obras de fundo na estrutura do mesmo. Isso implicou a reconfiguração das enfermarias, com a destruição de paredes, etc. Como calculam, durante o dia, nos outros pisos, o barulho era imenso, muitas vezes, quase insuportável para sãos, quanto mais para doentes, na sua grande maioria “presos” a uma cama. Numa das visitas eu dizia a uma doente: “com este barulho e desassossego é impossível rezar”. E ela, entre outras coisas, retorquiu: “Sabe, Sr. Padre, aqui, lembro-me sempre daquela mulher do evangelho que, no meio do barulho da multidão, tocou na fímbria do manto de Jesus e não deixou de ser atendida. Eu aqui, só rezo isso. E sei que também vou ser atendida.”
Com esforço, contive as lágrimas e agradeci-lhe a excelente “aula de espiritualidade” que me tinha oferecido.
É isso mesmo: por mais adversas que sejam as situações (interiores ou exteriores), não deixemos nunca de “estender a mão” e, com a oração, tocar, ainda que ao de leve, em Jesus.
Mas estava uma menina de doze anos, moribunda, à espera de Jesus. Por isso, Jesus continua o seu caminho. E, enquanto caminham, chegam os criados, que trazendo a triste notícia de que a morte da menina tinha chegado antes de Jesus. Ora, Jesus, que até aqui se tinha limitado a acompanhar Jairo, sem nada dizer, diz-lhe agora a primeira palavra audível: «Não temas; basta que tenhas fé».
Verificamos, assim, que na fé, Jesus nunca chega atrasado. Mesmo que no caminho Ele tenha de dar atenção a outros irmãos e situações.
Jesus entra na casa de Jairo, pega na mão da menina e diz, em aramaico, língua materna de Jesus e da menina: ««Talita Kum» [= Menina, levanta-te!].
A palavra de Jesus desperta a própria morte. Desta «ressuscitação» da menina, Jesus ordena que não se diga nada a ninguém. Ora esta «ressuscitação» da menina, aponta para a Sua própria «ressurreição». E esta, a ressurreição de Jesus, não pode ser calada. É para ser anunciada aos quatro ventos, a todas as nações e a todos os corações.
Em conclusão, o Evangelho deste XIII Domingo do tempo Comum, oferece-nos duas cenas únicas e belíssimas onde emerge a humanidade e divindade de Jesus, o seu poder sobre a morte e a sua vontade de dar sentido à vida. Que na nossa fé humilde, toque e seja tocada Jesus, e dela resulte sempre o mesmo humanismo. E com a ajuda do salmista também nós possamos louvar o Deus que liberta o orante da tristeza, da doença, do luto e da morte, e o faz exultar de alegria, saúde e vida.