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Lições bíblicas

A Igreja no Pentecostes reconhece a sua primeira obra – o anúncio – os Apóstolos não preparam uma estratégia, não preparam um plano pastoral, não dividem as pessoas por grupos segundo os vários povos, não se mantêm fechados no cenáculo, pois o Espírito Santo não lhes permite isso.

Domingo de Pentecostes

“Assim como o Pai me enviou, também Eu vos envio a vós: Recebei o Espírito Santo” (Jo 20, 21-22)

No Domingo de Páscoa, Jesus envia os Apóstolos em missão numa união íntima com Deus Pai, dá aos Apóstolos o Espírito Santo. Todo o texto deste Evangelho é significativo, pois conduz-nos à narração da criação, quando Deus cria o homem do pó da terra e lhe insufla o sopro da vida “então Deus formou o homem do pó da terra e insuflou-lhe pelas narinas o sopro da vida” (Gn 2, 7). Jesus tem o mesmo gesto, sopra sobre os Apóstolos, faz uma nova criação, a Igreja que nasce d’Ele e a partir d’Ele no Espírito Santo. Jesus “soprou sobre eles”, transmitiu-lhes o sopro da vida. Na narração da criação, Deus, do nada, fez o homem e soprou-lhe o sopro da vida, transmite-lhe a vida. Jesus, no Evangelho deste Domingo de Pentecostes, soprou sobre os Apóstolos, transmitiu-lhes uma vida nova, a nova criação a partir da Sua Ressurreição. Esta nova criação é a Igreja que recebe o Espírito Santo e se deixa transformar, guiar, conduzir, por este mesmo Espírito, que é vida para o cristão. “A vida que Jesus nos dá é uma história de amor, uma história de vida que quer misturar-se com a nossa e criar raízes na terra de cada um. Essa vida não é uma salvação suspensa ‘na nuvem’ – no disco virtual. A salvação, que Deus nos dá, é um convite para fazer parte duma história de amor, que está entrelaçada com as nossas histórias; que vive e quer nascer entre nós, para podermos dar fruto onde, como e com quem estivermos” (ChrV 252). Jesus ao soprar sobre os Apóstolos transmite-lhes esta vida, esta vida é, também, acolhida por cada um de nós no dia de Pentecostes.

No dia de Pentecostes a Igreja fica unida. Há diversidade de dons, de ideais, de pensamentos, mas o Espírito unifica, o diverso torna-se o um só, a diversidade torna-se o mesmo, a Igreja nasceu assim mesmo: diversos, unidos pelo mesmo Espírito, na harmonia da nova criação. Jesus não muda os Apóstolos, não uniformiza, deixa-os com as suas diversidades, com o seu “eu”, mas une-os, ungindo-os com o Espírito Santo. A união dos Apóstolos, a união da Igreja está na unção. No dia de Pentecostes os Apóstolos experimentam esta união, ao constatar que todos, apesar de falarem diversas línguas, de terem ideais diferentes, formam um só povo, o povo de Deus.

O que nos une? O que une a Igreja de hoje? Em que se baseia a nossa unidade?
Quando nos sentimos inseridos numa sociedade, na qual cada pessoa quer defender o seu eu, as suas ideias, o seu comodismo, pactuando apenas com quem pensa como ele, que não aceita o diferente. Esta é a fé à nossa imagem e não aquilo a que nos convoca o dia de Pentecostes, o princípio de unidade no Espírito Santo. “Deus, deseja actuar connosco e contar com a nossa cooperação, é capaz também de tirar algo de bom dos males que praticamos, porque «o Espírito Santo possui uma inventiva infinita, própria da mente divina, que sabe prover a desfazer os nós das vicissitudes humanas mais complexas e impenetráveis»” (LS 80). O Espírito ama-nos e conhece o lugar de cada um no todo, transforma-nos, do caos do íntimo de cada um, cria harmonia. Pois, o segredo da unidade da Igreja, o segredo do Espírito é o dom. Porque Ele é dom, vive doando-Se e, assim, nos mantém unidos, fazendo-nos participantes do mesmo dom. “Cada um de nós tem em si uma identidade pessoal, capaz de entrar em diálogo com os outros e com o próprio Deus. A capacidade de reflexão, o raciocínio, a criatividade, a interpretação, a elaboração artística e outras capacidades originais manifestam uma singularidade que transcende o âmbito físico e biológico” (LS 81). Os dons do Espírito Santo que nos levam a sair de nós mesmos, da nossa mesquinhez para entrarmos na relação com a grandeza de Deus, com o Tu que é Deus.

A Igreja no Pentecostes reconhece a sua primeira obra – o anúncio – os Apóstolos não preparam uma estratégia, não preparam um plano pastoral, não dividem as pessoas por grupos segundo os vários povos, não se mantêm fechados no cenáculo, pois o Espírito Santo não lhes permite isso. O fogo do amor, o Espírito, abre, relança, impele para além do que já foi dito e feito, Ele impele para além dos recintos duma fé tímida e cautelosa e os Apóstolos partem animados num único desejo – dar o que receberam. Os Apóstolos fazem da sua própria vida um dom, um dom gratuito que receberam de Deus e que no dia de Pentecostes reconhecem que também eles têm a missão de o darem, e, assim, transmitirem a verdadeira imagem de Deus – Amor gratuito. Recorda o Papa Francisco na Exortação Apostólica Cristo Vive que, “esta vocação missionária tem a ver com o nosso serviço aos outros. Com efeito, a nossa vida na terra atinge a sua plenitude, quando se transforma em oferta. Lembro que «a missão no coração do povo não é uma parte da minha vida, ou um ornamento que posso pôr de lado; não é um apêndice ou um momento entre tantos outros da minha vida. É algo que não posso arrancar do meu ser, se não me quero destruir. Eu sou uma missão nesta terra, e para isso estou neste mundo»” (ChrV 254).

O Espírito Santo, a presença do Amor de Deus em cada um de nós, ajuda-nos a amar humildemente, a servir gratuitamente e com alegria. Para vivermos esta missão, este anúncio do amor de Deus necessitamos de nos curarmos do nosso individualismo, do nosso egoísmo, da vitimização, do pessimismo que não permitem que assumamos a missão de Apóstolos e não nos deixam ser dom. Necessitamos do fogo do Espírito Santo para termos a coragem de viver a esperança na alegria da doação, de viver a vida nova em Cristo, de viver o desejo de servir, de fazer o bem, de sermos construtores de unidade no amor.

“O Senhor chama-nos a participar na sua obra criadora, prestando a nossa contribuição para o bem comum com base nas capacidades que recebemos” (ChrV 253).

Pe. Gonçalo Fernandes, CM
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