Solenidade de Jesus Cristo, Rei do Universo
No último Domingo do Ano Litúrgico, a Igreja convida-nos a contemplar Jesus, como Rei do Universo. Uma solenidade que nos desafia a saber encontrar Jesus na terra, no rosto do outro, para um dia, com Ele viver no céu. É esta a proposta de reflexão que nos propõe o Pe. Gonçalo Fernandes.
Estamos a celebrar a Solenidade de Cristo Rei. Neste domingo a Igreja proclama Cristo como Rei do Universo. A Igreja passou todo um ano a preparar-se para esta solenidade. Fez caminho, sentiu-se peregrina, para este encontro com Cristo. A realeza de Cristo continua a reflectir-se na Igreja, não como uma afirmação de poder, mas sim através da vivência da justiça e da caridade. O Evangelho de hoje assenta, precisamente, nestes dois pilares, nestas duas vertentes da vida da Igreja, a justiça e a caridade, a verdade e o amor. Estamos perante um julgamento realizado por um juiz justo que procura que cada um faça uma introspecção de si mesmo, da sua realidade, do seu ser em relação, do seu alter-ego. A base e o termo do julgamento são a caridade, o amor, a misericórdia. Onde encontramos a Cristo, com quem o identificamos. Com quem se identifica a Ele Cristo. Proclamamo-lo como rei, ele identifica-se com o pobre, com aquele a quem se estende a mão. Na medida em que cada um de nós estende a mão a esse pobre, identifica-se com Cristo que está presente nesse pobre. Já não sou eu que assisto, mas sou eu que sou assistido, porque nesse toque eu sou curado no meu interior, do meu egoísmo, do meu individualismo; sou curado no meu eu em relação com o meu irmão. Contudo, será difícil que nos comprometamos, que dediquemos energias a dar a mão a quem está mal se não cultivarmos uma certa austeridade, se não lutarmos connosco próprios para não nos transformarmos em pobres insatisfeitos que tudo querem ter e provar.
Toda esta liturgia, é de imagens simples, de linguagem fácil de compreender, a linguagem da caridade. Na primeira leitura, o profeta Ezequiel, apresenta-nos a imagem do Pastor que procura o melhor para as suas ovelhas, que tudo faz para encontrar a ovelha perdida, para orientar a ovelha tresmalhada – Deus tudo faz para que cada um o posso encontrar, possa estar com ele, possa viver dele. Nós estamos sempre à espera de sinais grandiosos, de conversões miraculosas, de grandes intervenções. Cristo leva-nos ao simples, às coisas ordinárias do dia-a-dia, aos pequenos gestos, às pequenas intervenções, para aí podermos despertar, em nós, o chamamento à santidade. Como salienta o Papa Francisco “Aproveito as ocasiões que vão surgindo cada dia para realizar acções ordinárias de maneira extraordinária” (GE 17). A grandeza do amor não está só no que fazemos, mas na forma como o fazemos.
Todo o Evangelho conduz à pergunta: “Senhor, quando é que Te vimos… e fizemos? Quando é que te vimos… e não te prestámos assistência?” Conduz ao discernimento pessoal, àquilo que cada um foi desenvolvendo, construindo em si duma forma natural, sem que o fizesse para agradar aos outros, para que os outros vissem e aplaudissem, mas, sem se dar conta do bem que faz, cultiva em si o amor, a caridade. Cristo pretende que cada um de nós “discirna o seu próprio caminho e traga à luz o melhor de si mesmo, quanto Deus colocou nele de muito pessoal” (GE 11). É nas pequenas situações, nas coisas simples do dia-a-dia que faço crescer em mim a misericórdia de Deus, que desenvolvo em mim os talentos que Deus me deu, sou luz e esperança para os meus irmãos.
Estamos perante as obras de misericórdia, a pauta da vida da Igreja, da vivência do amor de Deus nas situações práticas do dia-a-dia. Pois, “a misericórdia é a arquitrave que suporta a vida da Igreja. A misericórdia é a plenitude da justiça e a manifestação mais luminosa da verdade de Deus” (GE 105). Cristo coloca-nos perante a justiça divina, a qual se regula pela misericórdia, a misericórdia que uso para com o outro é a misericórdia que Deus usa para comigo, o amor que manifesto pelos mais pequeninos é o amor com que Deus me acolhe a mim. Ao vivermos a caridade continuamos a missão de Cristo na terra, tornamos visível a sua obra salvadora, tornamos presente o seu rosto de amor. Aí, está presente o convite a aproximarmo-nos mais dele, o convite a fazermos parte dele, como benditos do Pai, que através das coisas ordinárias do dia-a-dia realizadas de forma extraordinária tornamos presente o Reino de Deus no seio da Igreja. Por outro lado, o afastamento, porque nunca quisemos aceitar a presença deste amor divino em nós, porque nunca aceitamos ser humildes, simples, ser esperança para os mais pequeninos do Reino.
Cristo quer que cada um de nós se identifique com Ele através de gestos simples de misericórdia, de fé, como o gesto de, com carinho, oferecer ou dar um copo de água.
“A tua identificação com Cristo e os seus desígnios requer o compromisso de continuares, com Ele, este Reino de amor, justiça e paz para todos” (GE 25).
Vai e faz o mesmo!
Assim, Cristo poderá entregar o Reino a Deus Pai, para que seja tudo em todos.