XXXI Domingo do Tempo Comum
Zaqueu é hoje um sinal para a Igreja de que temos de reforçar a determinação de olhar as franjas e a ir às «periferias» geográficas e existenciais com a sabedoria do Evangelho. Temos, como Jesus, de «levantar os olhos» e saber suster o juízo precipitado. Com palavras e gestos determinados, ousar ir ao ENCONTRO, muito mais que esperar ser encontrados.
XXXI Domingo do Tempo Comum
Há já alguns anos que o site da PPCM tem este espaço de partilha de uma reflexão (homilética) inspirada na liturgia da palavra do domingo litúrgico correspondente. Confesso que, sempre que tenho sido chamado a fazê-lo, tenho partido mais de uma perspetiva homilética clássica.
No entanto, a liturgia deste XXXI domingo do tempo comum, ano C, levou-me a pensar especialmente naquelas pessoas que, pelas vicissitudes da vida, por desencanto ou desilusão com alguma(s) pessoa(s); por situações da sua vida pessoal e/ou familiar, se afastaram ou, pior ainda, se sentiram afastadas da sua comunidade paroquial, mas continuam a PROCURAR VER quem é Jesus na, cada vez menor, multidão que se junta em volta d’Ele. Pensei, também, naqueles que vão ler este texto a partir de uma «PROCURA» na internet ou, simplesmente, a partir de um «ENCONTRO IMPROVÁVEL» numa qualquer rede social. E, sem deixar de continuar a olhar para as “franjas”, resolvi também olhar para dentro de mim e da comunidade, na qual me ajudaram a crescer em estatura e, assim o espero, em graça.
O Evangelho que vamos escutar na liturgia assinala a passagem de Jesus por uma cidade chamada Jericó e narra também um daqueles ENCONTROS IMPROVÁVEIS entre Ele e um homem chamado Zaqueu, que era rico e chefe de publicanos. Aos olhos da multidão que seguia Jesus, era visto como um traidor à sua pátria judaica, colaboracionista com os ocupantes romanos, cobrando impostos aos seus irmãos de raça. Portanto, mais do que a sua estatura física, era a sua condição moral e social o maior obstáculo a poder ver quem é Jesus.
Por isso, resolveu adiantar-se e, de modo a ver e não ser visto, disfarçar-se entre a ramagem de um sicómoro. Mas, se é certo que, de dentro da copa do sicómoro, Zaqueu conseguiria ver Jesus, para ver quem é Jesus, a sua identidade e intimidade, a sua maneira de ser e de viver, é preciso um ENCONTRO pessoal.
E é aqui que entra em cena o grande PROCURADOR, que é Jesus. Levanta os olhos, vê Zaqueu escondido na copa do sicómoro, e diz-lhe de imediato: «Zaqueu, desce depressa, que Eu hoje devo ficar em tua casa». Ele desceu rapidamente e recebeu Jesus com alegria.»
Zaqueu começou imediatamente a ver quem é Jesus. Ao contrário da multidão, que O censurou por ir «hospedar-se a casa de um pecador», Jesus não o insulta, não o empurra, não traz preconceitos, não lhe exige que mude antes para poder entrar na sua casa. Isto é, não o exclui, mas chama-o, acolhe-o e inclui-o.
E, já em casa, na proximidade do tu a tu, Zaqueu apresentou-se ao Senhor, dizendo: «Senhor, vou dar aos pobres metade dos meus bens e, se causei qualquer prejuízo a alguém, restituirei quatro vezes mais». «Hoje entrou a salvação nesta casa.», retorqui-lhe, Jesus.
O pequeno Zaqueu é, neste caminho, muito mais do que ele próprio. É símbolo de quantos vivem desassossegadamente em atitude de procura. Como diz Tomás Halík: é ícone dos «buscadores», dos «espreitadores». Os traços da sua personalidade e as circunstâncias daquele encontro, são uma parábola do que também hoje significa «procurar ver quem é Jesus». Mesmo se esses «buscadores» ainda não saibam nem chamem Jesus àquilo que procuram. Ou mesmo que não seja de todo Jesus que eles procuram. Efetivamente, é cada vez maior o número destes «buscadores» que estão, simultaneamente disponíveis para ver quem é Jesus, mas, por eles próprios ou por imposição da “multidão”, acham-se demasiado pequenos para esse ENCONTRO de salvação.
Caro(a) «buscador(a)», quero que saibas que, para nós, membros, infelizmente ainda em alguns casos, portadores de uma mentalidade demasiado eclesiocêntrica, de multidão alfandegária e moralista, a pergunta que, cada vez mais, ressoa é: como estar à altura da visão de Jesus? Como fazer para ajudar a (re)descobrir no Evangelho uma hermenêutica válida da vida, uma fonte inspiradora de um modo bom e belo, verdadeiro e justo de viver?
Zaqueu é hoje um sinal para a Igreja de que temos de reforçar a determinação de olhar as franjas e a ir às «periferias» geográficas e existenciais com a sabedoria do Evangelho. Temos, como Jesus, de «levantar os olhos» e saber suster o juízo precipitado. Com palavras e gestos determinados, ousar ir ao ENCONTRO, muito mais que esperar ser encontrados. E, no seguimento e continuação dos gestos do nosso Senhor e Salvador, estar à altura desse abraço de Deus à humanidade que tem na história um nome: Jesus Cristo.