IV Domingo do Tempo Comum
Para olhos e ouvidos, como os nossos, viciados em coisas evidentes e espetaculares, é urgente e necessário redobrar a atenção para conseguir ver os Sinais/Milagres e escutar os apelos do Senhor naqueles que nos são enviados, vivem e convivem connosco!
IV Domingo do Tempo Comum
No domingo passado a liturgia fazia-nos escutar o episódio da sinagoga de Nazaré, onde Jesus, lendo um trecho do profeta Isaías, no final, o assume como programa do Reino de Deus, revelando que aquelas palavras antigas se cumprem, “hoje”, isto é, por Ele, com Ele e n’Ele. E assim se re-apresentava aos seus conterrâneos como aquele sobre o qual poisou «o Espírito Santo» consagrando-O e enviando-O a cumprir a missão de salvação a favor da humanidade. Foi, na verdade, uma afirmação ousada. Pois, somente quando o Messias viesse tal Escritura seria cumprida.
O Evangelho de hoje (cf. Lc 4, 21-30), IV domingo do tempo comum, ciclo C do ano litúrgico, é a continuação daquela narração e mostra-nos a reação de admiração, ou talvez de escândalo, dos seus conterrâneos ao ouvir que um dos seus, «o filho de José» (v. 22), pretende ser o Cristo/Messias.
Jesus, com a sua capacidade de penetrar as mentes e os corações, entende imediatamente o que pensam os seus conterrâneos. Eles julgam que, sendo Ele um deles, deve demonstrar esta sua estranha “pretensão” realizando milagres ali, em Nazaré, como fez nas povoações vizinhas (cf. v. 23).
Mas Jesus não quer e não pode aceitar esta lógica, porque não corresponde ao plano de Deus: Deus quer a fé, eles querem os milagres, os sinais; Deus quer salvar todos, e eles desejam um Messias que lhes garantam uns quantos privilégios. E para os fazer compreender a lógica de Deus, Jesus invoca o exemplo de dois grandes profetas antigos: Elias e Eliseu, que Deus tinha enviado para curar e salvar pessoas de outras culturas e proveniências, mas que tinham confiado/acreditado na sua palavra.
Com efeito, o caminho da fé não é fácil. Sobretudo, quando Deus insiste em visitar-nos de modo humilde, simples, próximo, nas coisas pequenas e banais.
Para olhos e ouvidos, como os nossos, viciados em coisas evidentes e espetaculares, é urgente e necessário redobrar a atenção para conseguir ver os Sinais/Milagres e escutar os apelos do Senhor naqueles que nos são enviados, vivem e convivem connosco!
Talvez por isso, como os conterrâneos de Jesus também muitos dos nossos concidadãos, diante deste convite a abrir os seus corações ao amor gratuito e universal, revoltam-se e assumem atitudes agressivas, que degeneram em violência, como nos diz o evangelho: « Levantaram-se, expulsaram Jesus da cidade e levaram-n’O até ao cimo da colina sobre a qual a cidade estava edificada, a fim de O precipitarem dali abaixo. (v. 29).
Já antes o profeta Jeremias tinha vivido a mesma experiência de Jesus. Mas o Senhor ordena: «Eu te escolhi… Eu te consagrei e te constituí profeta…. Cinge os teus rins e levanta-te…Não temas diante deles… Hoje mesmo faço de ti uma cidade fortificada… Eles combaterão contra ti, mas não poderão vencer-te, porque Eu estou contigo» (cf. Jer 1, 17-19). Isto é, se por um lado, o Senhor espera fé e confiança dos enviados; por outro, espera daqueles aos quais o profeta é enviado a capacidade de discernir, de acolher e de acreditar.
Também hoje, o mundo tem necessidade de ver nos discípulos do Senhor profetas, ou seja, pessoas corajosas e perseverantes em responder à vocação cristã. Pessoas que seguem o “impulso” do Espírito Santo, que as envia para anunciar esperança e salvação aos pobres e aos excluídos; pessoas que seguem a lógica da fé e não dos miraculismos; pessoas dedicadas ao serviço de todos, sem privilégios nem exclusões.
Por outro lado, a mesma visão de fé que faz distinguir e acolher os profetas do Senhor, também nos abre os olhos para reconhecer nos outros irmãos de verdade, irmãos no Senhor e amá-los verdadeiramente. É este o verdadeiro dom, o maior carisma que edifica a Igreja e a sociedade, de que fala São Paulo na segunda leitura. Sem o amor de Deus, nada tem sentido para o Reino de Deus, nem mesmo a fé!
Em conclusão, quem salva, podemos mesmo afirmar, não é a fé, mas o amor que dá vida e sabor à fé. E o amor a Deus, que desabrocha no amor aos irmãos, tem que ser concreto: deve ser visto na paciência, na benignidade, na generosidade, na humildade, na gratuidade, na mansidão, na retidão, na verdade...