REFLEXÃO DOMINICAL
XVIII DOMINGO DO TEMPO COMUM - ANO A
Compaixão, Partilha, Eucaristia
João Maria Lemos
Padre Vicentino
As leituras deste domingo mostram-nos Jesus na Sua missão. Se relacionarmos este Evangelho com os das semanas passadas, veremos inclusivamente que Jesus não foi um teórico do Reino dos Céus, mas visibilizou-o, pela proximidade, pelo acolhimento, pela mensagem anunciada e pelos milagres que fez. Tanto a 1.ª Leitura como o Evangelho falam-nos da gratuidade de Deus: um Deus que não se pode comprar nem Se deixa vender, um Deus que vem ao encontro do ser humano para o socorrer, um Deus que nunca nos abandona. A profecia de Isaías centra-nos no essencial da nossa vida e da nossa relação com Deus: Deus não nos cobra nada, dá-nos o que tem de melhor, a sua frescura, a sua vida: “Todos vós que tendes sede, vinde à nascente das águas. Vós que não tendes dinheiro, vinde, comprai e comei. Vinde e comprai sem dinheiro e sem despesa, vinho e leite”.
Quem vive com Deus e para Deus percebe que há um outro alimento que sacia a nossa fome: “Abris, Senhor, as vossas mãos e saciais a nossa fome” (Salmo 144). Quem mata a fome em Deus ou a sede na sua fonte cria uma profunda relação com Ele, de tal modo que as dificuldades da vida, em vez de afastar-nos de Deus, aproximam-nos ainda mais, porque percebemos a sua presença. Foi o que sentiu São Paulo, como nos diz na carta aos Romanos: “Quem poderá separar-nos do amor de Cristo? A tribulação, a angústia, a perseguição, a fome, a nudez, o perigo ou a espada? Mas em tudo isto somos vencedores, graças Àquele que nos amou”. “Nada pode separar-nos do amor de Deus, como tantas vezes dizia Santa Teresa de Ávila: “Quem a Deus tem, nada lhe falta: só Deus basta”. “Deixemo-nos amar por Deus para amar”.
O Evangelho apresenta-nos o milagre da multiplicação dos pães e dos peixes. Jesus realizou-o na margem do lago da Galileia, num lugar isolado, para onde se tinha retirado com os seus discípulos, depois de ter recebido a notícia da morte de João Batista. No entanto, foi seguido e alcançado por uma enorme multidão; e vendo-a, Jesus sentiu compaixão por ela e curou os doentes até à noite. Então, os discípulos, preocupados porque a noite já caía, sugeriram-lhe que despedisse a multidão, para que todos pudessem ir aos povoados, a fim de comprarem algo para comer. Mas Jesus respondeu-lhes: “Não precisam de ir embora; dai-lhes vós de comer!” (Mt 14,16). “Não temos aqui senão cinco pães e dois peixes, disseram”. Então, disse-lhes Jesus: “Trazei-mos cá”. E, depois de ter mandado trazer os cinco pães e os dois peixes, abençoou-os e começou a parti-los e a oferecê-los aos discípulos, que depois os distribuíram ao povo. Todos ficaram saciados. Dos pedaços que sobraram, encheram doze cestos. Ora, os que comeram eram cerca de cinco mil homens, sem contar mulheres e crianças. Por aqui, vemos que a generosidade de Deus não tem limites, mas, para que tal aconteça, exige a nossa colaboração, aquilo que está ao nosso alcance.
Do Evangelho, saliento apenas três aspetos fundamentais:
1.º - Compaixão: Diante da multidão, Jesus não reage com irritação, não diz: “Estas pessoas incomodam-me!” Reage, isso sim, com um sentimento de compaixão (“e cheio de compaixão”), porque sabe que não o procuram movidos pela curiosidade, mas pela necessidade. A compaixão, que Jesus sente, não é simplesmente sentir piedade; é algo mais. Significa compadecer-se, ou seja, identificar-se com o sofrimento alheio, a ponto de o carregar sobre si. Assim é Jesus: sofre juntamente com cada um de nós, padece por nós, põe-se no nosso lugar. O sinal desta compaixão são as numerosas curas feitas por Ele. Jesus ensina-nos a antepor as necessidades dos pobres às nossas. Por mais legítimas que sejam as nossas exigências, nunca serão tão urgentes como as carências dos pobres, que não dispõem do necessário para viver. Falamos com frequência dos pobres. Mas será que nos identificamos com eles desde o ser ao agir? A situação de pobreza, nas suas várias formas, tornou-se ainda mais visível na situação de pandemia COVID-19, em que vivemos. Diante deles, não podemos ficar indiferentes. Vicente de Paulo compreendeu que os “Pobres são necessitados de pão e da Palavra de Deus”. “O supérfluo dos ricos é propriedade dos Pobres” (Santo Agostinho).
2.º - Partilha: É importante confrontar a reação dos discípulos, diante de pessoas cansadas e famintas, com a de Jesus. Os discípulos pensam que é melhor despedir a multidão, para que possa ir comprar algo para comer. Mas Jesus respondeu-lhes: “Não precisam de ir embora; dai-lhes vós de comer”. Dois motivos diferentes, que refletem duas lógicas opostas: os discípulos raciocinam segundo o mundo – a lógica da autossuficiência, do descarte -, outro nome para o egoísmo. Mas Jesus raciocina em conformidade com a lógica de Deus, que é a da partilha, da solidariedade, da misericórdia, do pão para todos. “Temos obrigação de nos incomodar, para auxiliar os pobres” (São Vicente). E a nossa atitude, a minha atitude: “Seremos capazes de atuar responsavelmente perante a fome de que tantos padecem, sabendo que há alimentos para todos?” Papa Francisco). Com a generosidade dos “cinco pães e dois peixes”, Jesus sacia uma multidão. Mais do que fazer milagres, importa que nos disponhamos a deixar que Jesus Cristo continue a fazer milagres por nosso intermédio.
3.º - Eucaristia: A multiplicação dos pães é símbolo da Eucaristia. Vê-se no gesto de Jesus que “tomou os cinco pães e os dois peixes, ergueu os olhos ao Céu e recitou a bênção. Depois partiu os pães e deu-os aos discípulos, e os discípulos deram-nos à multidão”. É o mesmo que Jesus fará na Última Ceia (cfr. Mt 26,26), quando instituir o memorial perpétuo do seu sacrifício redentor. Em cada Eucaristia, Jesus continua a saciar a nossa fome, a dar a vida por nós, a oferecer-se por cada um de nós, para que tenhamos vida e vida em abundância. Mas ter bem presente que a Eucaristia é Sacramento da Caridade, Amor, Compromisso, porque comer este Pão e deixar-se transformar por ele, significa fazer da nossa vida, entrega, serviço, doação, como Cristo.
Pe. João Maria, CM